ORDEM NASCENTE

Textos poéticos e filosóficos sobre a ordem nascente
A ordem nascente é ainda elusiva e periclitante. São muitos os profetas apocalípticos que auguram o fim dos tempos, e assim alimentam o medo no ser humano, facto que não pode bem servir a humanidade. Mas há, sem dúvida, crescentes indícios, vestígios, sinais que auguram o fim de um tempo, o ruir das estruturas... MARIANA INVERNO

20 setembro 2005

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Insuportável Frequência


Às vezes, sinto que poderia enlouquecer.

Hoje, por exemplo, achei que Amor seria apenas o que causasse

O corpo
a alma inteira
desdobrados em poemas
Para mim, poema é muito mais do que oração. Sagrada em si, não pode haver linguagem mais adequada do que a poética para a alma que ama, a alma que vibra no eco da alma amada.

Quando eu morrer, que alguém cante, entre profusões de flores, todos os poemas de amor que escrevi e grite num soluço:
Glória a esta alma poética!
Glória à ingenuidade, entregue nos braços enlevantes da palavra poética, suprema e transcendente!

Por vezes, quase atinjo. Quase…


Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh’alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!


Por que me é dado saber o que não pergunto, se não posso moldar a vida a meu contento?
Sadismo dos deuses, creio. Brincam com as minhas hélices. Liga, desliga. Liga agora uma. Duas. Desliga outra vez.

Entretanto, estou de cama. Com febre, tosse, o corpo quebrado.
Talvez seja o fim, sussurra a vozinha maldosa da mente obscura a projectar rapidamente imagens apocalípticas, a gripe pode matar, gripe das aves, gente contaminada por entre as multidões anónimas e mimos similares.

E se for? Estará tudo em ordem para os “meus” receberem uns dinheiros e resolverem os seus problemas? Sei lá, nunca se sabe, hoje em dia. Há aquelas letras pequeninas nos contratos dos seguros e dos bancos, letrinhas que ninguém lê e que depois nos tramam.
Tudo é possível. Menos, até agora, a experiência do Amor pleno…
Anda tudo desencontrado, resta-nos o chamado amor incondicional pelos seres humanos todos. E eu pergunto-me: o que é isso? Ninguém me soube ainda definir claramente esse sentimento e ainda menos pôde demonstrar-me a sua prática. Claramente tudo está condicionado por, sujeito a, dependente de… Além disso, não sinto nesta vida vocação para Madre Teresa de Calcutá. Não busco nem me contento com um desfile diário de drogados, esquizofrénicos, traumatizados, complexados, confundidos, aparvalhados ou simplesmente exaltados do chamado Novo Tempo. Vêm invariavelmente sugar a minha vitalidade de que tanto preciso para abrir caminho. A minha primeira responsabilidade é para comigo mesma, em seguida para com o grupo de almas a que pertenço e com o qual a minha tem um projecto comum. Não sou fornecedora de doses de salvação individual, não acredito em processos de fora para dentro.


Sou Luz Viva, dizem os das estrelas. Será…? Se assim fôr…que responsabilidade! Talvez seja por isso, admitindo que é verdade, que eu gosto que seja só o Amor a beijar o meu manto estelar. Talvez seja por isso que não quero compromissos com o faz-de-conta, não subscrevo tretas, acho-me ali onde a voz soa clara – soluçante, é certo – mas límpida e bela como um lírio orvalhado.






Uma vez, um poeta triste e passado, disse-me: Ai de ti, filha do Alto, quando cessarem todos os teus jogos, ver-te-ás cara a cara com a insuportável frequência do teu canto.
Morreu, pouco depois. Pensei, na altura, que fora a droga a falar.
Décadas mais tarde, resta-me lembrar com carinho o profeta.



MARIANA INVERNO, Notas Diárias à Sombra dos Tempos

18 setembro 2005

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Os Novos Escravos Humanos

Cada vez se torna mais claro para mim e para quem quiser ver que as sociedades vivem um processo rápido de declínio e não se apresentam muitas saídas.
Aqui estou de novo nesta Londres onde sempre me senti em casa e, de viagem para viagem, noto a cavalgante diferença. Em tudo: na aparência das pessoas, nos seus gostos, maneiras, forma de articular o pensamento, estilo de vida, motivações, et cetera.
Tristemente, sinto-me confrontada com multidões de seres humanos robotizados, imersos na corrida diária que lhes garanta a remuneração que vai pagar a casa, o carro, o restaurante, os cartões de crédito… Muita fealdade e descuido físicos, pouca capacidade de concentração no que quer que seja. Tudo se passa muito depressa, a desatenção ao que está para além da aparência e do imediato generalizou-se. É óbvia a programação (de fora para dentro), a falta de autonomia interior, a incapacidade de questionar o sem propósito de vidas que, dirigidas e manipuladas por uma ordem que não respeita a interioridade de cada um e que, utilizando o mais poderoso de todos os factores manipulatórios, o medo, aperta mais e mais o cerco em redor dos seres alienados em que nos tornámos. Tornámo-nos nestes seres que evadem tudo quanto os possa confrontar consigo mesmos e que buscam, desenfreadamente, um feelgood feeling qualquer que, em geral, acham que só lhes pode vir de uma das três coisas seguintes: o sexo (pelo sexo), o álcool (e/ou outras drogas) ou um consumismo desenfreado. Como não há preocupações nem trabalho com a subjectividade interior, como não se cultivou o discernimento nem ninguém está para esforços que não encaixem na programação recebida, estes seres humanos papam todos contentes a miserável cadeia de ídolos de pau carunchoso que a sociedade lhes impinge, nomeadamente através dos maquiavélicos media.



Qualquer um serve, desde que os jornais e a televisão lhes dêem tempo de antena, desde que movimentem directa ou indirectamente milhões de uma moeda forte e dêem escândalo e se permitam uma exposição continuada da sua vida ao voyeurismo das massas.


A res americana, baseada na pressão contínua até à exaustão e numa óptica de vida que profundamente atraiçoa os direitos fundamentais de todo o ser humano, tem vindo a espalhar os seus tentáculos por todo o planeta. Quase toda a gente vive em escravatura, de um tipo ou doutro. Pois o sinal mais preocupante e que melhor denuncia essa influência na natureza decadente dos nossos tempos reside no facto da maioria das pessoas acreditar que a sua libertação está intimamente ligada com a posse de muito dinheiro.
Ora o dinheiro em si mesmo não tem qualquer conotação. É talvez a matéria mais camaleónica que existe, pois qualifica-se através da intenção de quem o manipula e, dado o poder que representa, requer para bons resultados uma grande sabedoria, humanismo e consciência social por parte do utilizador. Estas são virtudes que não se desenvolvem na falta de autonomia interior em que as pessoas vivem e na completa falta de conexão com a sua interioridade.

Parece, neste cenário quase apocalíptico, não haver esperança. Discordo.
Os opressores esqueceram-se do mais valioso instrumento de que o espírito humano dispõe: a criatividade. Essa capacidade de juntar em combinações novas e únicas os dados a que a nossa consciência tem acesso é o caminho para fora da programação que nos é imposta. A criatividade questiona o conhecido e o provado, arrisca novos traçados, faz irromper o canto desconhecido. Ergue-se, esguia e dançante, a espreitar a vida por um novo ângulo nunca antes considerado. Infinita, inesgotável e userfriendly, recomendo a sua utilização diária, nos mais pequenos gestos.

Pela liberdade do ser humano autónomo, autêntico, pela alegria da vida plena!
A bem de um mundo melhor!


MARIANA INVERNO, Notas Diárias à Sombra dos Tempos

16 setembro 2005

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Anatomia do Espirito

Simplifiquem a vossa espiritualidade. Todos os meus estudos terrenos do céu me levaram à conclusão de que o céu não é um reino complicado. Portanto a teologia pessoal de cada um não deve ser complicada. Procurem acreditar apenas naquilo que o céu emitiu como essencial. Por exemplo:


· Todas as circunstâncias podem mudar num instante e toda a doença se pode curar. O Divino não está limitado pelo tempo, espaço ou preocupações físicas humanas.
· Sejam consistentes: vivam aquilo em que acreditam.
· A mudança é constante. Toda a vida atravessa fases de mudança difícil assim como de paz. Aprendam a acompanhar o fluxo da mudança em vez de tentarem impedir que a mudança ocorra.
· Nunca esperem que outra pessoa vos faça felizes – a felicidade é uma attitude e uma responsabilidade íntima e pessoal.
· A vida é essencialmente uma experiência de aprendizagem. Todas as situações, contrariedades e relações contêm uma mensagem que vale a pena aprender ou ensinar a outros.
· A energia positiva resulta mais eficazmente do que a energia negativa em toda e qualquer situação.
· Vivam o momento presente e pratiquem o perdão aos outros.

CAROLINE MYSS, Anatomia do Espírito
Ed. Sinais de Fogo

09 setembro 2005

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Gerir o Potencial

Ao nascermos, trazemos connosco uma constelação de potenciais e probabilidades que nos cabe desenvolver. O corpo das crianças traz em si o potencial de crescer até atingir a vida adulta. A inteligência, a sensibilidade, a vontade, a intuição, todos os sentidos não materiais – inclusive o próprio sentido do amor – também trazem o potencial de desenvolver-se. Não no isolamento, mas na sociabilidade e na interacção com os outros e com o mundo.
Como único ser consciente-reflexivo, dos que conhecemos, o ser humano recebeu da vida o poder e a responsabilidade de tornar-se sujeito deste desenvolvimento como pessoa e como colectividade. Dois factores ontológicos que a vida lhe forneceu para isto são o trabalho e a educação.
Só emancipando o seu trabalho, saber e criatividade de toda a opressão e alienação poderá tornar-se sujeito do seu próprio desenvolvimento e realizar mais os seus sentidos humanos e as suas potencialidades. O sistema do capital mundial oferece-lhe a base objectiva para a emancipação do seu trabalho e conhecimento, mas os benefícios dos ganhos da produtividade são estruturalmente apropriados pelos que controlam os recursos produtivos e os meios de comunicação. Só a democratização desses recursos e meios, a construção de uma socioeconomia solidária, isto é, fundada nos valores da complementaridade, reciprocidade, apoio mútuo e amorosidade podem viabilizar a democracia efectiva, e garantir a cada indivíduo e à sociedade a liberdade ao seu trabalho e o direito de ser sujeito pleno do desenvolvimento dos seus potenciais.


MARCOS ARRUDA, Humanizar o Infra-Humano
Ed. Vozes, São Paulo, 2003

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