ORDEM NASCENTE

Textos poéticos e filosóficos sobre a ordem nascente
A ordem nascente é ainda elusiva e periclitante. São muitos os profetas apocalípticos que auguram o fim dos tempos, e assim alimentam o medo no ser humano, facto que não pode bem servir a humanidade. Mas há, sem dúvida, crescentes indícios, vestígios, sinais que auguram o fim de um tempo, o ruir das estruturas... MARIANA INVERNO

23 julho 2004

CounterCentral hit counter

O POETA DA GUITARRA

Passou por nós como uma flor rara, avesso a hossanas e honrarias. Origem e vida humildes, o poeta da guitarra honrou Portugal e a alma portuguesa como só o sublime pode fazer. Anti-fascista, perseguido e sem o devido reconhecimento até muito tarde – fenómeno comum aos melhores filhos desta pátria perdida de si – o mestre da guitarra portuguesa era um homem aparentemente distraído de quase tudo menos do essencial.
Tive a alegria de o encontrar pessoalmente uma única vez, quando o convidei a actuar numa acção de promoção da imagem de Portugal em Barcelona. Lembro, com um nó na garganta, os acordes de guitarra a perpassarem mágicos e dolentes cada átomo daquele salão do Hotel Ritz, em total silêncio. Lembro que me correram lágrimas furtivas, pois a alma, a minha alma também tão portuguesa, podia enfim deixar escoar em público o seu pranto tão longamente contido, abraçada aos sons que dançavam num parto emotivo e tumultuoso como a origem do tempos...
Quando o saudei comovida, Carlos Paredes de olhos baixos balbuciou,Muito obrigado, minha senhora, sinto-me muito honrado, muito agradecido, é muita bondade sua...
Num mundo em que a mediocridade é exaltada todos os dias, em que se gastam e compram milhões em nome de ídolos de pés de cal – referenciais efémeros de uma paradigma em aguda decadência – deixai-me chorar, deixai-me cantar esta alma poética, a um tempo privada e universal, que por nós passou.
Que o seu canto perdure como um legado incomparável na memória desperta de todos os portugueses!
Lembrai o poeta da guitarra, lembrai o místico e o sublime tão longamente adormecidos na nossa alma colectiva...


MARIANA INVERNO, Notas Diárias à Sombra dos Tempos

BlogRating