JANELA PESSOANA
SONHO
MULTIDIMENSIONALIDADE
NADA SABER
Como se sonha, por onde se sonha, como se entra e se sai do sonho e se privilegia o sonhar, sem nada saber e bem pouco acordar...
O passado não é senão um sonho… De resto, nem sei o que não é sonho…Se olho para o presente com muita atenção, parece-me que ele já passou…O que é qualquer coisa? Como é que ela passa? Como é por dentro o modo como ela passa?
À beira-mar somos tristes quando sonhamos…Não podemos ser o que queremos ser, porque o que queremos ser queremo-lo sempre ter sido no passado…Quando a onda se espalha e a espuma chia, parece que há mil vozes mínimas a falar. A espuma só parece ser fresca a quem a julga uma… Tudo é muito e nós não sabemos nada…
Toda a hora é materna para os sonhos, mas é preciso não o saber…Quando falo demais começo a separar-me de mim e a ouvir-me falar. Isso faz com que me compadeça de mim própria e sinta demasiadamente o coração. Tenho então uma vontade lacrimosa de o ter nos braços para o poder embalar como a um filho…
Nenhum sonho acaba…Sei eu ao certo se o não continuo sonhando, se o não sonho sem o saber, se o sonhá-lo não é esta coisa vaga a que eu chamo a minha vida?
Os homens que pensam cansam-se de tudo, porque tudo muda. Os homens que passam provam-no, porque mudam com tudo…De eterno e belo há apenas o sonho…
FERNANDO PESSOA (1888-1935), O Marinheiro (excertos)
Quadros(2001-2003):LENA GAL
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home